As ruas estão vazias,
Talvez pela hora mostrada no relógio
O uníssono silêncio ecoa pela avenida
Mais uma avenida vazia na noite...
O vazio da noite é o retrato mais fidedigno
Desse passeio aleatório por lugar nenhum...
Desculpe, eu quis dizer vida.
Venero o silêncio da noite, o mais absoluto
e pacífico silêncio.
A mesma rua que agora se cala
Mais cedo gritava, urrava, e eu estava lá sem entender nada.
Naquele barulho onde todos queriam se fazer ouvir
Lá estavam homens tão vazios que o que tinham
A botar para fora não era mais do que a mera expectativa
De tentar por alguns segundos, mesmo que por míseros segundos
Ser menos miseráveis, os miseráveis raramente
Querem continuar a sê-lo.
Enquanto a cidade de dia, com um calor estúpido gritava
Onde a voz e a temperatura se degladiavam
Para saber quem seria mais alta e mais efêmera
Onde o suor e a fala, duas manifestações de externalização
Do que já não nos pertence pareciam brotar
Eu escutava atentamente
E eles nada diziam.
Eu era menos eu naquele barulho
Naquele ensurdecedor barulho
Eu me perdia lentamente em mim
A cada segundo...
Viver também é placebo, eu pensava...
Veja bem, não é que eu seja pessimista
É que de fato não há tantas razões assim pra se viver...
Então eu penso em Dostoiévski, então eu me lembro de Shakespeare
Então eu sou Hemingway digitando em sua máquina de escrever...
E viver não é uma escolha...
Não é mais moral, não é mais bonito
Não é sequer estético ou atraente
Viver se torna o silêncio da noite...
E veja bem, você pode temer o escuro,
Acender as luzes, iluminar o seu quarto,
Mas você ainda é prisioneiro do silêncio da noite
Ela ainda ecoa o teu próprio ser
De noite o seu espelho mostra as rugas do seu rosto
É o seu passado se fazendo presente bem ali,
Naquela glândula incômoda chamada consciência
Que te vigia de dentro do seu travesseiro.
Respire,mais um segundo, você está começando a se conhecer
Hemingway sabia, Dostoiévski sabia...Eles sabiam
E agora você começa a saber.
Abrace o silêncio, é uma perturbadora imagem nadar no escuro
Há pureza na beleza de se deixar engulir pela ausência
Agora você está vivo, você se perdeu no escuro
E se você conseguiu voltar essa parte de você
Essa parte que agora habita esse mesmo receptáculo cru
Cozido lentamente pela poeira e pelo sol, pelo calor humano
Essa parte de você que retornou da incrível jornada do silêncio
Isso é só os outros...
Você é o que se perdeu
Você é o doce fardo de estar só
Apresenta o seu monólogo do mundo
Quando não há ninguém para aplaudir
De dia você é o mímico
Que mimetiza a cópía
De uma cópia
De uma cópia
De uma cópia
Onde está você agora que a cortina se fechou?
Apresentando seu espetáculo
Seu sonho de uma noite de verão
Em decassílabos
E ninguém nunca saberá.
Viver não é permitido
É proibido proibir
Viver é coibido
É coibido coibir
Viver não nos é escolhido...
Sendo vivido(na voz passiva) é que vivi.
O caminho de Santiago
Postado por
farley ramos
domingo, 20 de maio de 2018
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